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RODOANEL – RODOMINÉRIO
Alça Sul e alça Oeste
Desde 2020, quando o Governo Estadual aprovou o decreto declarando de utilidade pública, para desapropriação de pleno domínio ou constituição de servidão, terrenos necessários à construção do Rodoanel da Região Metropolitana de Belo Horizonte e libera para a empresa que ganhar a concessão de promover a desapropriação, o processo do Rodoanel já estava posto. Em 2021 iniciaram e foram finalizadas as audiências públicas em um curto espaço de tempo. Não podemos esquecer que todo o processo do Rodoanel, inclusive as audiências, se deram em tempos de pandemia, com pouca visibilidade para o processo.
Para completar o quadro no dia 14/07/2021, a Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) aprovou o projeto de Lei que autoriza o governo do estado de Minas Gerais a concretizar medidas, no que toca à tragédia de Brumadinho (MG). Dos R$ 37,68 bilhões que a mineradora Vale irá destinar à reparação dos danos provocados por ela, R$ 3,5 bilhões foram reservados para esta obra que contornará a região metropolitana de Belo Horizonte, ligando as rodovias federais BR-040, BR-381 e BR-262, conforme consta em proposta. Apesar de todos as manifestações contrárias de várias entidades na frente da assembleia, os deputados aprovaram a PL.
Mesmo com a aprovação da PL, os protestos continuaram contra o Rodoanel. No último dia 15/08, cidadãos comuns e manifestantes de coletivos socioambientais realizaram um protesto em favor da preservação da água e dos recursos naturais e culturais da Região Metropolitana de Belo Horizonte-RMBH. A manifestação aconteceu na Serra do Rola Moça, no mirante por onde irá passar a alça sul, conforme previsto no estudo.
Segundo o Frei Gilvander, “o melhor caminho a seguir é reforçar a luta, fazendo o possível e o impossível, antes que ele seja iniciado. Não podemos jamais aceitar nenhuma alternativa de traçado ou trajeto, pois não existe um traçado que seja justo.” Na opinião dele, o rodoanel é uma “grande mentira”, não irá resolver os problemas viários, irá complicar ainda mais, pois será uma autoestrada privada. Ele também fala que quando os municípios afetados, descobrirem que serão brutalmente impactados, não apoiarão esta ideia. Devido a pandemia, as audiências, não comtemplaram toda a população que será atingida pela obra. Segundo ele o melhor caminho é continuar na luta socialmente, politicamente e judicialmente.
De acordo com a SEINFRA (Secretaria de Estado de Infraestrutura e Mobilidade de Minas Gerais) o traçado final e o estudo de impacto ambiental serão feitos pela empresa vencedora, com acompanhamento e orientação permanente do Estado.
Os impactos que aconteceram em Minas, sem um prévio aviso, como o das minerações, que provocaram tanto desastre, tantas mortes, será usado como base para provocar um desastre de proporções ainda não calculadas. A empresa que ganhar poderá modificar o traçado. Será que a modificação do traçado levará em conta a diminuição do impacto ambiental, ou a motivação será a diminuição do custo da obra para a concessionária que irá tocar a obra? Em 2015 foi criada uma agenda mundial no sentido de criar e implementar políticas públicas que visam guiar a humanidade até 2030. Os 17 ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) cobrem diversos temas, inclusive cidades sustentáveis, água e saneamento, mudança climática, proteção e uso sustentáveis dos ecossistemas terrestres, crescimento urbano inclusivo, infraestrutura, meios e implementação e etc. Neste projeto vemos grande interferência no meio ambiente e nas comunidades, sem a devida discussão com toda a população envolvida.
A conclusão do relatório elaborado pela comissão externa da Câmara dos Deputados e coordenado pelo deputado Rogério Correia, exige que o Rodoanel não seja iniciado, que ocorra a interrupção do mesmo, e que seja retomado do início, com todos os estudos necessários, pois “o projeto do Rodoanel ignora o caráter imprescindível para o estado, para os municípios e para a biodiversidade, de centenas de unidades de conservação e outros espaços territoriais especialmente protegidos como a Área de Proteção Ambiental Vargem das Flores, o Parque Estadual Serra do Rola Moça, o monumento Natural Serra da Calçada e o cemitério dos escravos, tombado, pertencente a um território cultural quilombola.”
O anel rodoviário existente hoje, com seus 27 quilômetros de extensão é uma das principais vias para passar por Belo Horizonte e já, há algum tempo, dá sinais de saturação e esgotamento. Mas porquê? Será que ele foi todo concluído? Vale lembrar que, segundo Osias Baptista Neto, consultor em mobilidade, o anel existente hoje não foi concluído completamente. O problema mais sério no Rodoanel hoje é a falta de infraestrutura viária. O anel existente hoje não tem articulação com o transporte público, faltando a ligação de ônibus com os municípios. Será que o anel proposto resolverá esta grande questão de infraestrutura? Os ônibus poderão passar para fazer a ligação, com os bairros que serão cortados, serão divididos ao meio, e ficarão sem comunicação. Os atropelamentos irão diminuir? A população será separada da sua escola, ou do seu centro de saúde e terá dificuldade de passar e conseguir acessar os serviços, que antes ficavam dentro do bairro e de fácil acesso. Ainda não se sabe como esta ligação será feita, ou se ocorrerá. A certeza que temos hoje é que uma grande população será afetada
Segundo o Seinfra (Secretaria de Estado de Infraestrutura e Mobilidade de Minas Gerais), no anel atual, passam mais de 100 mil veículos por dia e os congestionamentos, em média, levam 45 minutos de atraso nas viagens. Além disso, o Departamento de Edificações e Estradas de Rodagem de Minas Gerais (DER/MG) aponta que são mais de 5 mil acidentes por ano, muitos graves ou fatais. O projeto do rodoanel, portanto, tem como objetivo sanar esse problema, mas para o Dr. Frederico daqui a seis anos quando o Rodoanel estiver pronto, estes dados estarão ultrapassados. O traçado prevê uma rodovia de 100 quilômetros, com quatro faixas e pedágios que cobrariam R$ 0,35/km. Conforme o DER/MG, o rodoanel reduziria os acidentes por ano e o tempo de viagem seria reduzido entre 30 e 50 minutos, tanto para veículos de carga, quanto na mobilidade urbana. Além disso, diminuiria o fluxo de caminhões nas regiões marginais e urbanas de Belo Horizonte entre 4 mil e 5 mil veículos comerciais. Será que este número ocorrerá mesmo? Porque o caminhão que vem do Rio iria passar pelo Rodoanel e não pelo anel existente hoje, para fazer a ligação por Brasília, que seria mais direto?
Segundo Frederico Rodrigues, doutor em engenharia de transportes, sócio fundador da InTraff, ele acha que em qualquer lugar do mundo externalizar o tráfego de atravessamento de cidades é plausível, a construção de anéis externos, é um ponto importante, mas será que o Rodoanel irá resolver o problema do anel rodoviário de hoje? Para ele, isto não é verdade. Ele não é contra o rodoanel, mas da forma como está posto, ele fala que o trafego daqui a seis anos, quando o Rodoanel ficar pronto irá crescer muito e o máximo, que irá acontecer, é voltar a termos um anel rodoviário como temos hoje. Por isto falar em Rodoanel, sem falar em obras no anel rodoviário atual não estará resolvendo o nosso problema.
As alças norte, oeste e sudoeste têm estimativa de conclusão de três anos. Já a alça sul irá levar cerca de quatro anos para ser concluída, por uma questão técnica do projeto. Porque será que esta alça irá demorar tanto? Será que passar pelo Parque Estadual da Serra do Rola Moça e a Serra da Calçada – essa tombada desde 2008 pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha) por seu conjunto histórico e paisagístico – dificultará a obra? Será que nos projetos apresentados, existe previsão orçamentária para impacto ambiental, desta magnitude? Como será tratado uma questão tão importante como esta?
Para o Fórum Permanente do São Francisco, os principais impactos da Alça Sul estão na região onde ocorrerá a construção de túneis, na base das serras, cujo miolo é formado pelos aquíferos Cauê, Gandarela e Moeda, o que pode provocar rebaixamentos de lençol freático, perdas de nascentes e, mais uma vez, impactos diretos no abastecimento da RMBH.
A Alça Sul irá passar em áreas remanescentes de um caminho de pedras construído possivelmente por escravos e ruínas do Forte de Brumadinho, datado do século 18, que serviu como área de fundição de ouro e passagem de pessoas e mercadorias no Brasil Colônia.
O Parque possui seis mananciais, e estes são responsáveis pelo abastecimento de água de parte da RMBH. São eles: Rola Moça, Taboões, Bálsamo, Catarina, Barreiro e Mutuca, todos declarados pelo Governo Estadual como Áreas de Proteção Especial (APE).
O Parque possui uma vegetação característica de cerrado e Mata Atlântica, com ocorrência de Campo Rupestre Ferruginoso, possuindo uma biodiversidade muito rica, constituída por várias espécies da fauna, como a onça parda, o lobo-guará, o cachorro-do-mato, o carcará, o veado campeiro e várias outras espécies de aves, e uma flora rica e bela, como a canela-de-ema, espécie símbolo do Parque, várias outras espécies de bromélias, orquídeas e cactáceas.
A alça Oeste proposto no estudo do Rodoanel- apelidado pelos movimentos de Rodominério, passa pela cidade de Contagem, gerando um grande impacto na Área de Proteção Ambiental-APA Vargem das Flores. Preservar as nascentes que abastecem a represa de Vargem das Flore, é garantir água para o futuro. Hoje com a urbanização acelerada, e a forma irregular de ocupação da zona rural, já podemos ver uma diminuição significativa da água destas nascentes que abastecem a represa. Segundo a Copasa a represa Vargem das Flores está com a menor vazão do ano, 39% da sua capacidade. Quando ocorre a diminuição do fluxo das nascentes, a represa não recebe a quantidade de água que deveria, ou quando chega, chega com muita sujeira.
Para Cristina Oliveira, do SOS Vargem das Flores, o grande problema do Rodoanel, além do desmatamento, o Rodoanel pode atrair indústrias para suas margens e induzir, a longo prazo, a instalação de novos bairros, assim como aconteceu no entorno do anel rodoviário atual. O adensamento populacional e a urbanização são problemas graves já debatidos pela população à época da votação do atual Plano Diretor de Contagem, aprovado em 2018. Outro ponto que ela levanta é a falta de consulta pública para toda a população atingida.
Em 2018, um estudo, que foi solicitado pela Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa) à Fundação Coppetec, apontou que seguindo a tendência de ocupação da Bacia Hidrográfica de Vargem das Flores, o reservatório de Vargem das Flores pode perder seu espelho d’água em 33 anos ou mesmo estar assoreado em 23 anos.
O rodoanel pode contribuir muito para o assoreamento da represa, além da movimentação de terra própria da rodovia, tem os novos bairros, mesmo que sejam proibidos, o processo de ocupação em beira de estrada urbana é muito grande, impossível de conter”, analisa Cristina. “O rodoanel é uma obra de interesse metropolitano, isso aí sem dúvida, menos caminhões passando em BH pode ajudar. Mas acontece que a água também é um interesse metropolitano. E nós temos aí dois interesses conflitantes. Vamos ter rodoanel e vamos ficar sem água?”. Ela lembra ainda que em nenhum momento o questionamento que a obra irá comprometer os recursos hídricos é refutada.
Outra grande questão proposta pelos movimentos que são contra o rodoanel, é quem estaria sendo beneficiado com esta obra? As entidades acham que a Vale, seria a grande envolvida nesta obra e responsável pelo crime social e ambiental que resultou em centenas de mortes, destruição de famílias, ecossistemas e cursos d’água. Os movimentos alertam que a Vale será uma das principais beneficiadas pelo Rodoanel, que reduzirá os custos de transporte de minério, compensando os gastos com a obra. Conforme falado pelas entidades, esses recursos deviam ser destinados para ações que fosse de interesse da população que sofreu o impacto e também para a recuperação ambiental da região afetada.
Como se dará a relação do Rodoanel com a Lei de uso e ocupação de solo de cada município afetado? Esta questão é de suma importância. O desenvolvimento imobiliário ao longo das alças, com certeza acontecerá e não sabemos como isto será acompanhado, principalmente porque ao longo destes trajetos encontramos muitas APPs.
Vamos pensar sempre que a participação da sociedade no processo sempre acrescenta e enriquece o processo. O planejamento futuro antecipa os problemas. Antecipar o futuro permite às cidades estarem mais preparadas para o hoje. O projeto que responda às preocupações dos cidadãos é um meio para proporcionar uma cidade melhor. Então vamos debater e crescer neste processo para que a RMBH agradeça no futuro.